A COPA É CULPADA? Parece que se
tornou um hábito brasileiro sempre achar um culpado para tudo. A Copa do
Mundo de Futebol é a mais nova culpada pelo desempenho da indústria
brasileira. A manchete do jornal “O Estado de São Paulo" (12-08-14)” diz isso: "Copa
do Mundo agrava acrise da indústria:produção industrial recuou 6,95 em
relação a junho de 2013, a pior comparação anual desde setembro de
2009". Que há uma gradativa desindustrialização do país, isso é
visível já há algum tempo. Para falar em junho, com dois terços da Copa
do Mundo, só a indústria automobilística recuou 12%. Mas, evidente, não
foi só a Copa, embora seja certo que, em seu período, houve menos horas
trabalhadas e maior número de trabalhadores em férias. De 24 setores
pesquisados pelo IBGE, 18 deles apresentaram queda na produção. Isso já
vinha acontecendo. Realmente, estamos necessitando de um trabalho sério,
tecnicamente sustentável, capaz de melhorar o desempenho na indústria.
Mas, um fator só, e ainda isolado, não explica.
BALANÇA COMERCIAL: já em julho,
ainda acontecendo parte da Copa do Mundo, o saldo da balança comercial
foi positivo em 1,57 bilhão de dólares, porém insuficiente para reverter
o déficit acumulado do ano, atualmente em quase um bilhão de dólares.
Ainda assim, há que se registrar que foi contabilizada a “exportação”
de uma plataforma de petróleo no valor de 866 milhões de dólares. De
positivo mesmo, foi o arrefecimento das importações de lubrificantes e
combustíveis e aumento das exportações de petróleo bruto. Houve também
boas remessas de soja para o exterior. Alguns especialistas afirmam que a
queda nas importações ocorre em função da desaceleração econômica. A
chamada “conta petróleo” continua tirando o sono do governo brasileiro:
em 2014, o déficit acumulado já está próximo de 10 bilhões de dólares,
com perspectivas de melhoras para os próximos anos.
ECONOMIA DO AUTOMÓVEL: a indústria
automobilística, dita brasileira, começou suas atividades nos idos da
década de 1950. Convidaram-se grandes fabricantes americanos e europeus,
tomando-se o cuidado de também criar uma indústria nacional, a Fábrica
Nacional de Motores (FNM), fabricante dos famosos caminhões Fenemê. Num
país de grande extensão territorial, esperava-se que as ferrovias fossem
estimuladas. Ocorreu justamente o contrário e houve grande expansão da
malha rodoviária. Por um grande período, a indústria foi protegida e
importar veículos era proibitivo. Essa situação começou a mudar na
década de 1990, quando o então presidente Collor chamou os nossos
automóveis de “carroças”: o mercado foi aberto e hoje vemos desfilar
pelas ruas brasileiras tantos carros fabricados por aqui como no
exterior. Tivemos até um presidente que quis ressuscitar o Fusquinha, o
primeiro carro da Volkswagen fabricado no Brasil.
CONTROVÉRSIA: apesar do progresso da
indústria automotiva, da presença de grandes montadoras e da evidente
expansão do crédito para o setor, a economia nacional (leia-se empregos)
passou a depender muito dela. Algumas análises foram feitas alertando
sobre essa dependência, que alguns não viam como boa para o país. Davam
como exemplo os Estados Unidos, onde a crise se instalou e algumas
cidades, antes conhecidas pelo vigor de sua indústria automobilística,
estavam em franca decadência, caso de Detroit. Não se pode misturar
análises de um mesmo setor em países diferentes e os Estados Unidos
sofreram também perdas tecnológicas, cedendo espaço para indústrias de
outros países. O Brasil, vivendo um novo surto de desenvolvimento,
especialmente na primeira década do milênio, beneficiado pelas
circunstâncias nacionais e internacionais, aumentou sua produção de
veículos e uma parcela da população, antes fora desse mercado, passou a
comprar. Foi um ganho social importante.
INDÚSTRIA EM GERAL: o fenômeno da
desindustrialização não atingiu somente o Brasil, mas aqui os efeitos
são mais danosos. Durante anos, o Brasil, por exemplo, não tinha
indústria aeronáutica, mas a Embraer tem feito bonito nos mercados
internacionais e segue forte, sendo um exemplo de sucesso. Houve um
esforço para a recuperação da indústria naval e os governos recentes
tiveram papel importante nisso. Há outros setores, inclusive o do
petróleo, que tendem a ser mais fortes no futuro. Mas, há também
indagações muito frequentes como os espaços que estamos perdendo para
produtos chineses, cuja fabricação não requer grandes habilidades
tecnológicas. Ou ainda, a camisa de força que tem sido o Mercosul,
impossibilitando o país de fazer novas parcerias comerciais. Há que se
estudar tudo isso, de forma profissional, sem emoções, buscando o melhor
futuro para o país.
AUSÊNCIA DE DEBATE: é lamentável,
mas não se vê este tipo de debate na sucessão presidencial. Não somos
donos da verdade e gostaríamos de discutir esses assuntos com maior
frequência. Mas, parece, essa sucessão será marcada por acusações mútuas
de corrupção e incompetência para governar, já que os dois principais
postulantes ao cargo tiveram experiência executivas. Se a Copa do Mundo
de Futebol tem culpa de alguma coisa, foi a de reduzir drasticamente o
tempo de debate da sucessão presidencial. Por outro lado, registra-se em
função dos fatos o desinteresse da população em geral, com crescentes
intenções de votos brancos e nulos. Agora, com a morte de Eduardo
Campos, novos cenários podem ser desenhados.
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