quinta-feira, 26 de setembro de 2024

Turmas do TST divergem sobre possibilidade de condenação por dano-morte

 O dano morte não está previsto na legislação trabalhista, mas ganhou força depois da tragédia de Brumadinho


As turmas do Tribunal Superior do Trabalho (TST) têm dado decisões divergentes sobre a existência do chamado dano-morte, devida ao funcionário pelo sofrimento nos minutos que antecederam sua morte. O dano morte não está previsto na legislação trabalhista. É tratado na doutrina, mas pouco aplicado na Justiça.


A tese ganhou força depois da tragédia de Brumadinho (MG), em 2019. Por ora, existe decisão da 3ª Turma reconhece o dano-morte e julgados da 5ª Turma que negam. A Seção de Dissídios Individuais (SDI), responsável por unificar a jurisprudência das turmas, já recebeu um processo sobre o tema, mas ainda não há data para julgamento.


No dia 30 de agosto, a Vale teve seu recurso negado na 3ª Turma para tentar reverter sua condenação de pagamento de indenizações de R$ 1 milhão a familiares de 131 trabalhadores mortos, em ação movida pelo Sindicato dos Trabalhadores na Indústria e Extração de Ferro e Metais Básicos de Brumadinho e Região (Metabase), no processo 10165-84.2021.5.03.0027. A condenação ocorreu em outubro de 2023. A empresa ainda pode recorrer.


A Vale alegou no recurso que o sindicato não teria legitimidade para pleitear uma ação em nome dos funcionários que morreram, uma vez que a morte teria extinto o vínculo sindical. Ainda argumentou que o valor de indenização extrapola os limites da razoabilidade e proporcionalidade e que ultrapassa os parâmetros dados com a Lei da reforma trabalhista (Lei 13467, de 2017) para danos morais, aceitos como balizas em julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF), nas ADIs 6050, 6069 e 6089, de caráter vinculante. Para a empresa, o valor do dano “deverá observar o parâmetro do salário de cada ofendido no arbitramento do valor da indenização”.


Ao analisar o recurso, contudo, o relator, ministro José Roberto Freire Pimenta, entendeu que não há que se falar em omissão no julgado “no qual ficaram explicitadas claramente as razões pelas quais o recurso da reclamada não lograva êxito nos referidos temas, seja no que diz respeito ao reconhecimento da legitimidade ativa ad causam do sindicato-autor, seja na manutenção do quantum arbitrado a título de indenização pelo dano-morte, cujos temas foram examinados estritamente de acordo com o que fora veiculado em suas razões recursais, em atenção ao princípio da devolutividade recursal.”.


Para a 3ª Turma, o dano-morte tem que ser reconhecido porque deveria haver o mesmo tratamento dos casos em que se dá indenização para trabalhador que morre em decorrência de acidente de trabalho. Segundo o entendimento da turma, essa indenização não se confunde com danos morais pelo sofrimento da família.


Já na 5ª Turma foram julgados dois processos individuais nos quais os ministros negaram a existência do dano morte, por entender que a morte foi instantânea e que o direito de pedir reparação se extinguiria com a morte. Os processos são o 10895-46.2020.5.03.0087 e o 0011001-71.2020.5.03.0163). Em um deles, já existe recurso para a Seção de Dissídios Individuais (SDI-1).


Apesar de a Vale já ter firmado acordo com o Ministério Público do Trabalho (MPT) para o pagamento de indenizações, famílias e sindicatos passaram a entrar com ações pleiteando o dano-morte, com a alegação de que os trabalhadores mortos, e não só as famílias, também deveriam ser indenizados. Ao todo, 272 pessoas morreram em decorrência do rompimento da barragem da Mina Córrego do Feijão, em Brumadinho (MG).


O dano-morte tem sido fundamentado no artigo 12, parágrafo único, do Código Civil, que estabelece que, em caso de morte, tem legitimidade para pleitear direitos da personalidade, o cônjuge sobrevivente ou qualquer parente em linha reta ou colateral até o quarto grau. O artigo 943 do Código Civil e na Súmula 642, do Superior Tribunal de Justiça (STJ) também dizem que o direito de exigir reparação transmite-se com a herança.


Segundo o advogado do Sindicato Metabase de Brumadinho, Luciano Pereira, “a recente decisão da 3ª Turma confirma a condenação da Vale a indenizar as vítimas desse que foi o maior acidente de trabalho da história brasileira, verdadeira tragédia-crime”. Para ele, “essa decisão tem caráter histórico e pedagógico, na medida em que o Tribunal reafirma a natureza protetiva da Justiça do Trabalho, tão atacada nos últimos tempos, e impede que frutifique a cruel tese da Vale de que trabalhador morto não tem direito à reparação, pelo simples fato de não estar mais aqui para reclamar”


Procurada pelo JOTA, a assessoria de imprensa da Vale informou por nota que “não comenta processos em andamento”.

Fonte: Jota

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