segunda-feira, 12 de junho de 2017

Profissionais qualificados vivem de favores e bicos

Para quem viu o sonho de um futuro profissional longo, estável e bem remunerado virar pó em poucos meses, o naufrágio do polo naval de Rio Grande é ainda mais duro do que as estatísticas sugerem. Segundo o presidente do Sindicato dos Metalúrgicos, Benito Gonçalves, quem trabalhava como ajudante nos estaleiros podia ganhar, entre salário e horas extras, até R$ 3 mil por mês e os supervisores, até R$ 12 mil, mas a promessa de prosperidade deu lugar a dívidas e desalento.

Ivânia Aparecida Pacheco, de 43 anos, era soldadora na Ecovix, onde trabalhava há três anos, mas foi demitida na penúltima leva de cortes, que atingiu cerca de 800 pessoas em novembro do ano passado. Dos bons tempos, tudo o que restou para ela foi um terreno comprado a prestações e com uma parcela já em atraso depois do fim do seguro-desemprego, uma pequena peça onde mora e uma casa que ela vinha construindo e finalizou com as verbas rescisórias.

"Meus armários estão vazios e uma amiga está me sustentando", desabafa a ex-soldadora. Ela não ocupou a casa nova porque quer vendê-la para quitar as dívidas, dar uma melhorada na peça onde mora e separar algum dinheiro para se manter enquanto espalha currículos atrás de um novo trabalho. O problema é que falta emprego e ninguém quer pagar os R$ 200 mil que ela pede pelo imóvel de dois dormitórios.

Divorciada, Ivânia morava em Rio Grande com o filho, que também foi demitido da Ecovix e mudou-se para Porto Alegre para trabalhar em uma empresa de manutenção predial. Ela é natural de Vila Nova do Sul, a 326 quilômetros de distância, mas luta com todas as forças para não voltar à cidade natal porque lá não existe alternativa a não ser a agricultura.

Francisco Assis de Oliveira, de 45 anos, natural de Ipatinga (MG), mudou-se há três anos do Espírito Santo, onde trabalhava no setor siderúrgico, para Rio Grande com a esposa e o filho. Passou pela QGI e depois pela Ecovix, até ser demitido em dezembro. O filho, que havia sido contratado por uma fornecedora de serviços para os estaleiros também perdeu o emprego e já voltou para Minas Gerais.

O seguro-desemprego acabou e enquanto Oliveira distribui currículos em outras empresas, faz bicos de jardinagem. A casa foi quitada com a rescisão, mas se ele não arrumar emprego logo, pretende vender o imóvel e o carro e voltar para Minas Gerais com a esposa e duas cachorrinhas adotadas em Rio Grande.

Ex-colega de Ivânia e de Oliveira, Viviane Nunes Gomes, de 41 anos, deixou o emprego de segurança de supermercado há cinco anos para ingressar no polo naval, primeiro em uma empresa especializada na montagem de andaimes e depois na Ecovix, mas foi demitida na leva do fim do ano passado.

Natural de Rio Grande, ela foi demitida junto com o filho e o marido, que haviam migrado da construção civil para a indústria naval e trabalhavam na mesma empresa. Os dois também perderam o emprego no fim de 2016 e a renda da família caiu para um terço do que era, mas isso graças ao seguro-desemprego que já está quase no fim. Por enquanto não foi necessário vender nada e a esperança de Viviane, agora, é por uma vaga nas obras de ampliação da fábrica local de fertilizantes da Yara Brasil.

Por Sérgio Ruck Bueno
Valor Econômico

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